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COM A PALAVRA IRMÃO RUBENS


quarta-feira, 9 de maio de 2012

LIVRO CRISTIANISMO PAGÃO

CRISTIANISMO
PAGÃO
A Origem das Práticas
de Nossa Igreja Moderna
Frank A. Viola
2
CRISTIANISMO PAGÃO:
ORIGENS DAS PRÁTICAS DE NOSSA IGREJA MODERNA
Título original em inglês: Pagan Christianity
The Origins of Our Modern Church Practices
Copyright © 2005 by Present Testimony Ministry
Published by
Present Testimony Ministry
ptmin@aol.com / www.ptmin.org
Esta versão em português foi traduzida e adaptada por Railton de Sousa Guedes
A versão inglesa foi impressa nos Estados Unidos da América
Se não especificadas, as citações bíblicas [versão inglesa] são da Versão King James.
Na versão original em inglês as referências bíblicas NIV foram retiradas da Holy Bible:
New International Version.
Copyright © 1973, 1978, 1984 by International Bible Society.
Used by permission of Zondervan Bible Publishers.
Referências retiradas da NASB são da
New American Standard Bible. Copyright © The Lockman Foundation
1960, 1962, 1963, 1971, 1972, 1973, 1975, 1977.
Citações usadas com permissão.
A minhas irmãs e irmãos esquecidos ao longo dos séculos que, valentemente, saíram fora dos
limites seguros do cristianismo institucional arriscando a própria vida. Fielmente, vocês levaram a
chama, agüentaram perseguição, perderam reputação e família, sofreram tortura e derramaram o
próprio sangue para conservar o testemunho primitivo de que Jesus Cristo é a Cabeça de sua
Igreja. E que cada crente é pastor... ministro... e membro funcional da casa de Deus. Este livro é
dedicado a vocês.
3
CONTEÚDO
Prólogo .............................................................4
Reconhecimentos ...............................................5
Prefácio .............................................................6
Introdução ........................................................8
1. Liturgia .......................................................13
2. Sermão .......................................................33
3. Edifício da Igreja ..........................................44
4. Pastor ..........................................................67
5. Costumes Dominicais ..................................87
6. Ministros do Louvor .....................................94
7. Dízimos e Salários Clericais ....................... 101
8. Batismo e Ceia do Senhor........................... 109
9. Educação Cristã ........................................ 116
10. Outra Perspectiva do Salvador ................. 128
11. Abordagem ao NT .................................... 131
Apêndice: Resumo das Origens ...................... 143
4
PRÓLOGO
Este livro deveria ter sido escrito há 300 anos atrás. Se isso tivesse ocorrido, a direção da história
cristã seria totalmente distinta daquela que tomou.
Se cada ministro lesse este livro hoje, ele deixaria o ministério amanhã ou viveria uma vida de hipocrisia.
A maioria de nossas práticas da fé cristã não tem absolutamente nada a ver com o NT. Praticamente tudo
que fazemos hoje enquanto cristãos chegou até nós incidentalmente. Virtualmente, todas nossas principais
práticas chegaram até nós durante os 50 anos do Imperador Constantino (d.C. 324) ou durante os 50 anos
após o começo da Reforma (1517).
O Sr. Viola nos prestou um grande serviço traçando a origem de todas nossas práticas protestantes.
Meu único pesar é que este livro será apenas um entre os 100 mil livros impressos este ano sobre a
temática cristã.
Trezentos anos atrás — ou mesmo duzentos — Cristianismo Pagão seria um entre poucas centenas de
livros... e, portanto, lido por uma grande porção de cristãos. Você pode ajudar a remediar isso falando deste
livro para todos seus amigos.
A propósito, você também enfrentará uma crise de consciência após você ler este livro. Você tomará
conhecimento das origens pagãs e não bíblicas de tudo que fazemos hoje. Você nunca poderá voltar a dizer,
“nos baseamos na Bíblia. Fazemos tudo conforme o NT”. Praticamente não fazemos nada que seja
neotestamentário, como veremos.
Mas há uma tragédia maior aqui. Tomamos o NT e o torcemos, fazendo o NT endossar o que fazemos
hoje. Esta mentalidade — que é universal — foi absorvida tanto pelo leigo como pelo clero... Esta
mentalidade vem — e continua — destruindo a fé cristã.
Herdamos uma situação tal que não temos absolutamente nenhuma idéia de como nossa fé deveria ser
praticada.
O que é que precisamos fazer? No que se refere à prática de nossa fé hoje, necessitamos começar tudo da
estaca zero, deixando de lado tudo que praticamos hoje.
Em segundo lugar, necessitamos aprender a história do século I e depois prosseguir em nossas próprias
práticas.
Mais uma vez, recomendo não apenas a leitura deste livro, mas também falar sobre ele com outros
cristãos que conhece para que também o leiam.
E depois? Siga sua consciência. Faça isso, e verá o ressurgimento daquelas simples e primitivas práticas
do século I.
Gene Edwards
Jacksonville, Flórida
A experiência provê a dolorosa prova de que as tradições, uma vez engendradas, são
primeiramente tidas como úteis, depois consideradas necessárias, até finalmente serem
transformadas em ídolos. Todos têm que se curvar diante delas ou haverá punição.
-J.C. Ryle
5
RECONHECIMENTOS
Idéias importantes são primeiramente ridicularizadas, depois atacadas e finalmente
absorvidas.
-Schopenhauer
Pouco tempo depois de abandonar o sistema religioso, procurei compreender como foi que a igreja
cristã chegou a seu estado atual. Por anos tentei encontrar um livro documentado que relatasse a origem de
cada uma das práticas não bíblicas que nós, cristãos, observamos a cada semana.1[1]
Esquadrinhei várias bibliografias e arquivos. Também entrei em contato com um monte de historiadores
e pesquisadores averiguando se eles conheciam alguma obra assim. Minha indagação rendeu uma resposta
consistente: Esse livro que eu buscava não existia. Então, em um momento de loucura, eu mesmo realizei
esta empreitada.
Confesso, sem vergonha de dizer, que desejaria que outra pessoa tivesse assumido esse projeto doloroso.
Algum professor sem filhos e sem trabalho durante o dia! Eu teria economizado um incalculável número de
horas de trabalho e muita frustração. Não obstante, agora que o trabalho está completo, eu estou alegre pelo
privilégio de ter desbravado novas terras nesta área tão negligenciada.
Alguém pode perguntar porque eu resolvi gastar tanto suor e sangue para documentar a origem de nossas
práticas da igreja moderna. A resposta é simples. A compreensão da gênese de nossas tradições eclesiásticas
pode perfeitamente mudar o curso da história da igreja. Como o filósofo Soren Kierkegaard disse, “A vida é
vivida adiante, mas entendida para trás”. Sem compreender os erros do passado, estamos condenados a um
futuro imperfeito. Por esta razão aceitei o desafio de ser o primeiro a escalar este projeto Himalaia.
Minha esperança ao publicar esta obra é simples, mas sombria. Que o Senhor a use como uma
ferramenta para trazer Sua igreja de volta às suas raízes originais. Dito isso, gostaria de fazer os seguintes
reconhecimentos:
A Gene Edwards por abrir caminho. Sem seus esforços pioneiros e seu ânimo pessoal eu não teria êxito.
A Frank Valdez por sua aguda perspicácia e seu constante companheirismo.
A Neil Carter por sua tenaz disposição em ajudar-me em minhas árduas investigações. Agradeço
também pelas horas dedicadas na revisão deste manuscrito.
A Howard Zinder pelas valiosas análises que somente os eruditos sabem fazer.
A Cris Lee e Adam Parke pelas repetidas viagens à Biblioteca trazendo pilhas de livros empoeirados até
meu escritório.
A Dave Norrington por enviar-me periodicamente
valiosas orientações do outro lado do Atlântico.
A Mike Biggerstaff, Dan Merillat, Phil Warmanen, Eric Rapp, e Scott Manning pelo auxílio na edição
[inglesa].
Aos professores dos seminários, cujos nomes são muitos para listar aqui, por responderem tão
amavelmente minhas intermináveis e persistentes perguntas.
Aqueles que não rememoram o passado estão condenados a repeti-lo.
-George Santayana
1[1] A única obra que pude encontrar sobre as origens das práticas da igreja moderna foi o pequeno volume de Gene Edwards, Mais que
Radical (Jacksonville: Seedsowers, 1999). Embora este livro seja fantástico, não está documentado nem contem notas ao pé da página.
6
PREFÁCIO
Por que vocês violam o mandamento de Deus por amor à sua tradição?
-Jesus Cristo
Quando o Senhor Jesus andou nesta terra, seus principais opositores vieram das duas principais
facções religiosas daquele tempo: Os fariseus e os saduceus.
A facção farisaica aumentava as sagradas Escrituras. Eles agregavam à Palavra de Deus um punhado de
leis humanas e as passavam para as gerações subseqüentes. Este conjunto de costumes consagrados, muitos
deles chamados de “tradições dos anciãos”, passaram a ser considerados iguais às Escrituras Sagradas2[2].
O erro dos Saduceus estava no outro extremo. Eles subtraíam blocos inteiros das Escrituras —
considerando apenas a Lei de Moisés como digna de ser observada.3[3] (Os saduceus negavam a existência
dos espíritos, anjos, alma, vida após a morte e a ressurreição).4[4]
O efeito imediato foi que quando o Senhor Jesus entrou no drama da história humana, Sua autoridade foi
arduamente desafiada.5[5] A razão era simples. Ele não se enquadrava nos moldes religiosos de nenhum dos
dois campos. Jesus era visto com suspeita tanto pelos fariseus como pelos saduceus. Não demorou muito
para que esta suspeita se transformasse em hostilidade. Logo os fariseus e os saduceus começaram a planejar
a morte do Filho de Deus!
Vivemos um tempo em que a história se repete. A moderna cristandade caiu nos mesmos erros dos
fariseus e dos saduceus.
Na tradição dos saduceus, a grande maioria das práticas do século I já havia sido retirada da paisagem
cristã. Meu livro, Repensando o Odre, revela algumas das práticas esquecidas que caracterizavam a vida da
igreja no século I.6[6]
Mas o cristianismo moderno também é culpado de cometer o erro dos fariseus. Ou seja, o cristianismo
moderno agregou um monte de tradições humanamente concebidas que acabaram suprimindo a direção
funcional, real e vivificante de Jesus Cristo enquanto Cabeça de Sua Igreja.
Dessa forma, tanto os fariseus como os saduceus nos ensinaram uma lição muitas vezes esquecida: É tão
nocivo diluir a autoridade da Palavra de Deus por adição como por supressão. Violamos as Escrituras tanto
ao enterrá-las sob uma montanha de tradição humana, como ao ignorar seus princípios.
Este livro dedica-se a expor as tradições adotadas com relação a Deus e Sua Igreja. Ao fazê-lo produz
uma séria conclusão: A igreja institucional moderna não tem qualquer direito bíblico nem histórico para
continuar existindo!
Isto não é obra para pesquisadores. Tão pouco é uma obra completa. Uma abordagem exaustiva das
origens de nossas práticas na igreja moderna encheria volumes e mais volumes e seria lido por poucas
pessoas. Embora este livro seja de apenas um volume, traz consigo uma grande quantidade da história em
um pequeno espaço. De fato, pode-se dizer corretamente que o que está contido nestas páginas é o resumo de
toda uma biblioteca!
2[2] Nelson’s Illustrated Bible Dictionary (Nashville: Thomas Nelson Publishers, 1986), pp. 830-831. Veja também: Mateus 23:23-24. Os
Fariseus obedeceram a Lei de Deus segundo sua própria interpretação, tal Lei era aplicada pelos Escribas. Os Escribas eram especialistas da
Lei e viveram vidas piedosas e disciplinadas. Eles chegaram a ser os intérpretes oficiais da Palavra de Deus e eram dotados com o poder de
criar a tradição. (Nelson’s Illustrated Bible Dictionary, pp. 957-958).
3[3] A “Lei de Moisés” refere-se aos primeiros cinco livros do Antigo Testamento, i. e. Gênesis a Deuteronômio. Também é chamada de
“Tora” (a Lei) e “Pentateuco”, o qual é um termo grego que significa “cinco volumes”.
4[4] New Bible Dictionary: 2nd Edition (Wheaton: Inter-Varsity Fellowship, 1982), p. 1055.
5[5] Marcos 11:28.
6[6] Tais práticas estão atualmente sendo restauradas em pequena escala por almas atrevidas que tomaram o espantoso passo de deixar o
refúgio do cristianismo institucional.
7
Este livro não tem a pretensão de trazer luz a todos os recantos da história. Pretende sim focalizar a
origem das práticas centrais que definem a principal corrente do cristianismo de hoje7[7]
É de vital importância a compreensão das raízes das práticas de nossa igreja moderna. Espero que cada
cristão alfabetizado leia esta obra.8[8] Por conseguinte, preferi não empregar uma linguagem técnica, mas
escrever em um português simples. Assim, agreguei notas ao pé da página contendo detalhes adicionais e
fontes ao longo de cada capítulo. (Eu quero que meus leitores saibam que eu não estou assoprando bolhas de
sabão nem construindo castelos de areia!)
Os cristãos reflexivos que desejam verificar minhas declarações e alcançar uma compreensão mais
profunda dos temas abordados devem ler as notas ao pé da página. Os que não se preocupam com tais coisas
devem ignorá-las.
Finalmente, este livro complementa meu primeiro livro Repensando o Odre: A Prática do NT. Ambos os
livros mostram os dois lados da mesma moeda. O Odre demonstra de uma forma cabal que aqueles que
abandonaram o aprisco do cristianismo institucional têm o direito bíblico de existir. O livro que você tem em
suas mãos mostra a outra face da moeda, eles têm também o direito histórico de existir.
Frank Viola
Brandon, Flórida.
Dezembro de 2002.
“Mas o Imperador está nu!” Disse um garotinho. “Falou a voz da inocência!”
Exclamou o pai; e cochichou para outro o que a criança dissera. “Ele está nu!” Correu de
boca em boca. “Ele está nu!” Bradou finalmente o povo. O Imperador ficou envergonhado
porque sabia que estavam certos; mas refletiu: “O cortejo precisa prosseguir!” Aprumou
ainda mais o corpo, e os camareiros, solenes, continuaram fingindo segurar o manto real
que não existia.
-Hans Christian Anderson
7[7] Este livro enfoca as práticas cristãs protestantes. Seu alcance principal é “a igreja hoje” do Protestantismo em vez da “alta igreja” como
as denominações Anglicanas, Episcopais, e um tipo de Luteranos. O livro abrange as práticas da “alta Igreja” Católica apenas de passagem.
8[8] Como disse Bacon certa vez, “As obras de Agostinho e de Ambrósio geram tanta sabedoria divina quanto qualquer história eclesiástica
bem lida e examinada”.
8
INTRODUÇÃO
VIVEMOS REALMENTE DE ACORDO COM AS ESCRITURAS?
Vida sem questionamentos é vida sem valor.
-Sócrates
Agimos conforme a Palavra de Deus! O NT é nosso guia de fé e prática! Vivemos... E morremos...
Pela Bíblia!
Estas foram as palavras que saíram da boca do Pastor Farley enquanto pregava seu sermão dominical
matutino. O Sr. Winchester Spudchecker, um membro da igreja do Pastor Farley, escutara tais sermões
dezenas de vezes antes. Mas desta vez foi diferente. Trajando seu terno azul, congelado no último banco com
sua esposa, Trudy Spudchecker, Winchester mirava fixamente o teto da igreja enquanto o Pastor Farley
trovejava sobre “fazer tudo de acordo com a Bíblia Sagrada”.
Uma hora antes do Pastor Farley iniciar seu sermão, Winchester brigara feio com Trudy. Isso acontecia
sempre que Winchester, Trudy, e suas três filhas, Felícia, Gertrude, e Zanóbia, se aprontavam para ir à igreja
nas manhãs de domingo.
Sua mente relembrava o ocorrido...
“Truuuddyy! Por que as meninas ainda não estão prontas!? Sempre nos atrasamos! Por que não as
arruma em tempo!?” Gritou Winchester.
A resposta de Trudy era tipicamente a mesma. “Se você me ajudasse, isso não aconteceria sempre! Por
quê não começa a dar uma mão nesta casa!?” O bate-boca continuou até que Winchester voltou-se contra
as meninas: “Zanóbia Spudchecker!... Por quê não nos respeita e se apronta em tempo!?... Felícia, quantas
vezes tenho que lhe pedir para desligar seu ‘Play Station’ antes das 9:00 horas!?” Muitas vezes uma ou
mais das três meninas choravam diante destas acusações, criando um tema ainda mais tenso.
Vestidos em sua melhor roupa domingueira, a família Spudchecker disparava em direção à igreja a toda
velocidade (Winchester odiava chegar atrasado e recebera três multas no último ano por excesso de
velocidade — todas referentes aos domingos pela manhã!).
Enquanto corriam em direção ao edifício da igreja, o silêncio no carro era lúgubre. Winchester se
acalmara. Trudy estava magoada. Cabisbaixas, as três irmãs Spudchecker preparavam suas mentes para algo
que detestavam... Agüentar mais uma hora chata de Escola Dominical!
Ao chegarem no estacionamento lotado da igreja, Winchester e Trudy saem radiantes do carro, abrindo
um enorme sorriso. Entram abraçados, saúdam os demais membros da igreja com um sorriso nos dentes
fingindo que tudo vai bem. Felícia, Gertrude, e Zanóbia seguem seus pais com os narizes empinados.
Estas foram as recentes e dolorosas lembranças vindas à mente de Winchester na manhã de domingo
enquanto o Pastor Farley proferia seu sermão. Carregado de culpa, Winchester começou a questionar-se:
Por que estou aqui vestido com minha melhor roupa fingindo ser um bom cristão quando apenas uma hora
antes me comportei como qualquer pagão?”
“Quantas outras famílias passaram por esta triste experiência nesta manhã? Estamos bem perfumados,
mas agradamos a Deus?”
9
Tais questões nunca haviam passado antes pela consciência de Winchester.
Observando a esposa e os filhos do Pastor Farley sentados com uma atitude afetada no primeiro banco,
Winchester matutava: “Será que o Pastor Farley também esculachou sua esposa e filhos esta manhã!?
Hmmm...”
A mente de Winchester vagava nessa direção enquanto observava o Pastor Farley golpear o púlpito e
levantar sua Bíblia com a mão direita. O Pastor trovejava... “Nós da Primeira Igreja da Comunidade Bíblica
do NT fazemos tudo por este Livro! TUDO! Esta é a Palavra de Deus, não podemos nos desviar dela... nem
mesmo um milímetro!”
Enquanto o Pastor Farley vociferava, ocorreu um pensamento inédito em Winchester: “Não me recordo
de haver lido na Bíblia que os cristãos devem vestir a melhor roupa para ir à igreja. Isto está nas
Escrituras!?”
Este único pensamento desencadeou uma torrente de outras questões cruciais. Observando aquelas
fileiras de gélidos espectadores sentados em seus bancos, a mente de Winchester foi inundada por
questionamentos. Perguntas que quase nenhum cristão formula. Questões como:
“Será que sentar nesse banco duro e ver cinco fileiras de nucas à nossa frente durante 45 minutos nos
faz agir segundo a Bíblia? Por quê gastar tanto dinheiro mantendo este edifício para passar aqui algumas
poucas horas e apenas duas vezes por semana? Por quê a congregação fica tão sonolenta quando o Pastor
Farley prega? Por quê minhas filhas odeiam tanto a Escola Dominical? Por quê passamos por este mesmo
ritual, previsível, mecânico, sonolento, a cada manhã de domingo? Se estou cansado dessa igreja que não
me acrescenta nada espiritualmente, por quê a freqüento? Por quê coloco esta gravata incômoda cada
domingo pela manhã enquanto ela corta a circulação de sangue para meu cérebro?”
Winchester lutava consigo mesmo enquanto estas questões martelavam sua mente. Ele sentiu-se como
que contaminado e sacrílego por pensar tais coisas. Sem dúvida alguma coisa diferente estava acontecendo
dentro dele que o compelia a colocar em dúvida toda sua experiência eclesiástica. Tais pensamentos
estiveram inativos por anos no subconsciente de Winchester, e agora vieram à tona.
Curiosamente, os questionamentos de Winchester naquele dia, praticamente nunca atingem a maioria dos
cristãos. Tais dúvidas simplesmente nunca assaltam nossos cérebros. A realidade é que os olhos de
Winchester se abriram.
Pode soar estranho, mas quase tudo aquilo que é feito em nossa igreja moderna não tem qualquer base
bíblica. Enquanto os pastores rugem do alto de seus púlpitos sobre seguir a “Bíblia” e trilhar a “pura Palavra
de Deus”, suas palavras lhes atraiçoam. É alarmante a terrível diferença entre nosso moderno cristianismo e
as práticas da igreja do século I.
Questões que Nunca Formulamos
Sócrates (470-399 a.C.) é considerado por alguns historiadores como o pai da filosofia. Nascido e criado
em Atenas, ele tinha o hábito de ir até a cidade e implacavelmente fazer questionamentos e analisar
assuntos.9[9] Com audácia, Sócrates colocava em dúvida os pontos de vista do povo de seu tempo. Ele
livremente discorria sobre temas que seus contemporâneos atenienses temiam discutir.
A mania de Sócrates de formular perguntas penetrantes às pessoas, fazendo-as participar e questionar
criticamente acerca de seus costumes, eventualmente acabou provocando sua morte.
Seus contínuos questionamentos do conjunto das tradições fizeram com que os líderes atenienses o
acusassem de “corromper a juventude”. Como resultado, eles mataram Sócrates. Uma clara mensagem foi
enviada aos cidadãos atenienses: Todos que ameaçarem os costumes estabelecidos terão o mesmo
destino!10[10]
Sócrates não foi o único filósofo a sofrer represálias pelo seu inconformismo: Aristóteles foi exilado,
Spinoza foi excomungado e Bruno foi queimado vivo. Sem mencionar os milhares de cristãos torturados e
assassinados pela igreja institucional por se atreverem desafiar seus ensinos.11[11]
Como cristãos, somos ensinados por nossos líderes a crer em certas idéias e nos comportar de
determinada maneira. Temos a Bíblia, claro. Mas estamos condicionados a lê-la com as cômodas lentes da
9[9] Sócrates acreditava que a verdade se encontra num extenso diálogo em torno de um assunto e de um incessante questionamento. Este
método é conhecido como “dialético” ou “método socrático”.
10[10] Para uma breve introdução à vida e ensino de Sócrates, veja Samuel Enoch Stumpf’s Socrates to Sartre (New York: McGraw-Hill,
1993), pp. 29-45.
11[11] Ken Connolly’s The Indestructible Book, Grand Rapids: Baker Books, 1996 e Foxe’s Book of Martyrs, Old Tappan: Spire Books, 1968.
10
tradição cristã à qual pertencemos. Nos ensinaram a obedecer nossa denominação (ou movimento) e jamais
desafiar tais ensinos.
(Neste momento todos os corações rebeldes estão aplaudindo e tramando usar os parágrafos anteriores
para criar estragos em suas igrejas. Se este é o seu caso, querido coração rebelde, quero acrescentar algo para
você em minha introdução. Longe de recomendar que faça isso, meu conselho é: Deixe sua igreja
silenciosamente para não causar divisões ou viva em paz com ela. Há uma grande distancia entre adotar uma
postura rebelde e ficar do lado da verdade).
A verdade é que nós cristãos nunca colocamos em dúvida aquilo que fazemos. Pelo contrário,
cumprimos alegremente nossas tradições religiosas, sem verificar de onde elas vieram. A maioria dos
cristãos que afirma apoiar-se na Palavra de Deus nunca investiga se aquilo que faz a cada domingo tem base
bíblica. Como sei isto? Porque se eles investigarem chegarão a conclusões bem incômodas. Conclusões que
compeliriam suas consciências a abandonar tudo que fazem.
Como veremos adiante, o pensamento e a prática da igreja contemporânea sofreram mais influências de
eventos históricos pós-bíblicos do que pelos imperativos e exemplos do N.T. (NT). A maioria dos cristãos
não tem consciência desta influência. Tampouco se dá conta de que eventos históricos pós-bíblicos criaram
montanhas de tradições.12[12] — todas rotineiramente passadas como “cristãs”.13[13]
Um Convite Assustador
Agora convido o leitor seguir-me por uma estrada inédita. Trata-se de uma terrível jornada onde você
será obrigado a responder questões que provavelmente nunca entraram em seu pensamento consciente.
Questões bem difíceis de responder, recorrentes, surpreendentes. Você será confrontado com respostas
perturbadoras. Respostas que deixarão você diante das melhores coisas que um cristão pode conhecer.
Nas próximas páginas você ficará atônito quando descobrir que aquelas coisas que nós, cristãos, fazemos
nas manhãs de domingo, não vieram de Jesus Cristo, dos Apóstolos ou das Escrituras. Nem mesmo vieram
do Judaísmo.14[14] Sendo mais específico, a maior parte daquilo que fazemos na “igreja” foi absorvido
diretamente da cultura pagã no período pós-apostólico.15[15] Sendo mais específico, a maior parte das nossas
práticas eclesiásticas foi introduzida durante três períodos de tempo: Após Constantino (324 a 600), no
tempo da Reforma (século XVI), e na era do Revivamento (séculos XVIII e XIX).
Cada capítulo mostrará as tradicionais práticas eclesiásticas. Depois revelará a história de onde vieram
tais práticas. E o mais importante, explicará como estas práticas sufocam e obstaculizam o funcionamento de
Seu Corpo.
Se você não está disposto a examinar seriamente seu cristianismo, não mais leia estas páginas. Doe
imediatamente este livro a algum sebo! Livre-se do incômodo de ter sua vida cristã virada de cabeça para
baixo.
Não obstante, se você opta por “tomar a pastilha rubra” e averiguar “até onde vai a toca do
coelho”.16[16]
12[12] Edwin Hatch, The Influence of Greek Ideas and Usages Upon the Christian Church (Peabody: Hendrickson, 1895), p. 18. Hatch
remonta os efeitos daninhos de uma igreja que foi influenciada por sua cultura em vez de uma igreja que influencia sua cultura.
13[13] Foi o filósofo cristão Soren Kierkegaard (1813-1855) que disse que o cristianismo moderno é essencialmente falsificado (Soren
Kierkegaard, Attack on Christendom, ET 1946, pp. 59ff., 117, 150ff., 209ff.).
14[14] Depois da destruição de Jerusalém no ano 70 d.C., o cristianismo judaico minguou em número e em poder. O cristianismo gentílico
dominava, e a nova fé começou a absorver a filosofia e os rituais greco-romanos. O cristianismo judaico sobreviveu ainda por cinco séculos
no pequeno grupo de cristãos siríacos chamado Ebionitas. Mas sua influência não foi muito difundida. Will Durant, Caesar to Christ (New
York: Simon & Schuster, 1950), p. 577. Segundo Shirley J. Case, “O ambiente social do movimento cristão não foi principalmente gentílico
antes do final do século I, este havia cortado as relações anteriores do contato social com os Judeus Messiânicos da Palestina. No ano 100
d.C., o cristianismo era principalmente um movimento religioso gentílico, vivendo juntos em um ambiente social comum gentílico” (The
Social Origins of Christianity, New York: Cooper Square Publishers, 1975, pp. 27-28). E. Glenn Hinson escreve, “Do final do século I em
diante, os gentios superaram em número aos judeus na assembléia cristã. Sutilmente eles importaram algumas das idéias, atitudes e costumes
da cultura grega e romana”. (Christian History, Volume XII, No. 1, Issue 37, p. 17).
15[15] “Pós-apostólico” significa depois da morte dos doze apóstolos. As lendas nos narram que o último apóstolo sobrevivente, João, morreu
por volta do ano 100 d.C. Segundo Paulo F. Bradshaw, o cristianismo do século IV, “absorveu idéias e práticas religiosas pagãs, vendo-se
como cumprimento das metas das religiões anteriores” (The Search for the Origins of Christian Worship, New York: Oxford University
Press, 1992, p. 65; Caesar to Christ, pp. 575, 599-600, 610-19, 671-672, 650-51).
16[16] Citação retirada do pensamento provocativo da película premiada “Matrix”. Na película, Morfis da ao Sr. Anderson a opção de viver em
um mundo de sonho enganoso ou compreender a realidade. Suas palavras são aplicáveis ao tema que temos: “Depois disto, não há como
voltar atrás. Tome a pílula azul, a história termina, você desperta em sua cama, e você acreditará no que quiser. Você toma a pastilha
vermelha e terei que lhe mostrar quão profunda é a toca cavada pelo coelho”. Espero que todo povo de Deus tome a pastilha vermelha!
11
Se você quer aprender a verdadeira história das origens de suas práticas cristãs, se está disposto a
desvendar o véu da igreja moderna e desafiar fortemente suas tradicionais pressuposições, então você
encontrará aqui uma obra perturbadora, informativa e possivelmente transformadora de vida.
Em outras palavras, se você é um cristão de igreja institucional que leva o N.T. a sério, o que você lerá
mais adiante o levará a uma crise de consciência. Você será confrontado por fatos históricos irrefutáveis.
Por outro lado, se você é um desses raros indivíduos que congrega com outros cristãos à margem do
cristianismo organizado, você redescobrirá que não apenas as Escrituras, mas também a história está a seu
lado.
Após cruzar florestas virgens,
Como fazem os bons bezerros
Um bezerro retornou para casa;
Mas uma sinuosa trilha seu rastro deixou
Como todos os bezerros deixam.
Trezentos anos se passaram desde então,
O bezerro está morto, eu acredito.
Mas seu rastro ainda permanece,
E a moral da história está aí.
No dia seguinte o rastro farejado foi
Por um cão solitário que por ali passou;
Então o sábio vaqueiro
Seguindo a trilha por vales e estepes,
Trouxe o rebanho atrás de si,
Como os bons vaqueiros fazem.
E desde então surgiu grande clareira na mata,
Pela velha floresta surge um caminho.
E muitos homens por ela foram e voltaram
E alargaram, arrumaram, ampliaram.
E proferiram palavras de justa ira
Por ser tortuoso tal caminho.
Mas mesmo a contragosto ainda o trilharam,
A primeira trilha daquele bezerro,
Por entre árvores e entre espinhos ficou sinuosa
Pois cambaleava enquanto caminhava.
Este caminho na floresta virou rua,
Que curva, vira e curva novamente;
Esta rua torta virou estrada
De pobres cavalos com suas cargas
Labutando sob o ardente sol
Numa viajem de três milhas e meia.
E assim por um século e um meio
Seguiram nos passos daquele bezerro.
Os anos voaram velozes,
12
A estrada virou rua de aldeia;
E antes que os homens dessem conta,
Virou avenida congestionada da cidade;
E logo rua central de uma metrópole renomada;
E homens há dois séculos e um meio andaram
Na trilha de um bezerro. a cada dia cem mil
Pessoas seguem o cambaleio do bezerro;
Tal tortuosa jornada vira rota de continente.
Por onde passam cem mil homens
Passou um bezerro, morto há trezentos anos.
E eles ainda seguem o caminho tortuoso,
E perdem cem anos por dia;
E assim prestam tamanha reverência
A tão bem firmado precedente.
A lição moral que isto ensina por mim é pregada;
Os homens são propensos a seguirem cegos
Ao longo das trilhas dos bezerros da mente.

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