O Que São as Concordatas?
Fonte: Concordat Watch
Estes acordos Igreja-Estado geralmente dão à Igreja Católica enormes subsídios do governo, além de outros privilégios. As concordatas também permitem que os funcionários da Igreja sejam importunados com relação às suas vidas privadas. Todavia, como "Tratados Internacionais", as concordatas escapam do processo democrático, tornando os parlamentos impotentes para modificá-las, e muito mais impotentes ainda para revogá-las depois.
Tratados Internacionais
A Lei Internacional tem sido chamada de "guerra por outros meios". [1] Entre os mais eficazes desses outros meios, estão os documentos papais chamados de concordatas. Uma concordata é um acordo entre o Vaticano e um Estado estrangeiro. Como o Vaticano é considerado um país [2], esses acordos criam um vínculo tão rígido quanto os tratados internacionais — porém existem em um plano mais elevado e possuem uma dimensão "espiritual".
"Uma concordata refere-se a um acordo cordial, uma união de vontades, o encontro bem-sucedido dos corações e mentes na harmonia cristã."
A Igreja Católica Romana tenta estabelecer concordatas com todos os países, e sempre que isso se torna politicamente possível. Essa estratégia se provou ser tão bem-sucedida que agora outras igrejas poderosas (mesmo aquelas que não reivindicam serem países) estão exigindo "tratados igreja-Estado" equivalentes. Entre elas estão a Igreja Luterana da Alemanha, e a Igreja Ortodoxa, da Bielo-Rússia e da Geórgia. Na verdade, se uma concordata futura for assinada entre o Vaticano e a República de Checoslováquia, até mesmo a Igreja Adventista do Sétimo Dia já declarou que também quererá uma. [5] Como um estudo recente elaborado por um teólogo católico conclui: "A Igreja Católica abriu o caminho para todas as comunidades religiosas desfrutarem dos mesmos direitos." [6] Compartilhando os despojos, isto produz um golpe fundamental na separação entre igreja e Estado.
Escritas na Pedra
As concordatas diferem em detalhes de um país para outro, pois codificam os privilégios que a Igreja já usufrui no país — e tentam acrescentar outros, tantos quanto o clima político local permita. Essa erosão da separação Igreja-Estado é perigosa, pois é uma via de mão única. Afinal, em um país democrático, sempre existe a possibilidade de algum privilégio ser revogado, se as circunstâncias mudarem. [7].
Entretanto, o principal objetivo de uma concordata é garantir os privilégios da Igreja, removendo-os do controle democrático. Isto é feito por meio de um contrato que não pode ser alterado, exceto por consentimento mútuo. Todas as outras leis estão sob o controle do Congresso e podem ser modificadas. Entretanto, no caso de uma concordata, como uma das partes é a Igreja, dificilmente ela estará disposta a abrir mão de algum de seus privilégios. Um cardeal admitiu francamente que a vantagem das concordatas reside exatamente nessa independência do controle democrático:
"Outros acordos estão sujeitos à lei local e, portanto, sempre serão frágeis, pois são dependentes dos riscos representados pelos regimes políticos ou pelas maiorias parlamentares do futuro." [8].
Pela Porta dos Fundos
Originalmente, as concordatas eram acordos entre dois monarcas: o papa que governava os Estados Papais e o rei de outro país. João Paulo II conseguiu fazer um acordo desse tipo com o rei Hassan II, do Marrocos, em 1983-1984. Em casos assim, não há um Congresso para criar dificuldades. Hoje, entretanto, com poucos reis e ditadores em cena, concluir uma concordata não é tão fácil, de modo que o Vaticano foi obrigado a desenvolver muitas formas de fazer as concordatas serem aprovadas por congressistas céticos.
Algumas vezes, o texto da concordata pode ser mantido em segredo até que tenha sido assinado, o que evita a discussão dos termos pelo Congresso ou pelo público. Quando os congressistas e o público ficam sabendo o que a concordata diz, ela já não pode mais ser alterada; somente pode ser aprovada ou rejeitada em sua totalidade. Há casos, inclusive, em que esse documento complexo e de caráter permanente é colocado em votação em regime de urgência no Congresso — para não permitir tempo para uma análise detalhada. Se isso não funcionar, as concordatas podem permanecer sem ratificação durante anos, até que apareça alguma oportunidade para escrevê-las na rocha. Em adição às centenas de concordatas que já estão em vigor no mundo inteiro, outras, como a "Concordata de Consciência" eslovaca, estão engavetadas e aguardando o clima político propício para serem ratificadas. Para mais sobre esse assunto, veja Doze Truques Para Conseguir a Aprovação de Sua Concordata. Dízimos Sem Adoradores
Seja por meios justos ou escusos, a Igreja tenta conseguir as concordatas. Isto não é de se admirar, pois a concordata blinda a Igreja contra todas as consequências financeiras de um número declinante de fiéis. Esse documento conveniente permite que a Igreja amplie seus privilégios, incluindo enormes subsídios do governo, embora o número de fiéis católicos esteja em declínio — e também coloca esses subsídios sob a administração da Igreja. É por isto que o governo eslovaco deseja introduzir um "tributo da Igreja" (uma porcentagem fixa do Imposto de Renda pago pelos fiéis), enquanto que a Igreja quer manter o status quo (uma doação anual de acordo com as necessidades presentes). [9] Se a Igreja conseguir estabelecer verbas para as "necessidades presentes" na próxima concordata sobre finanças, não haverá possibilidade realista de reduzir a contribuição do Estado — nunca mais.
Conclusão
Uma concordata faz três coisas:
Primeiro, instala uma roda dentada. A concordata solidifica os privilégios já existentes e acrescenta novos. O efeito da roda dentada não termina aqui, pois uma "concordata geral" pode ser usada para preparar a estrutura para concordatas mais detalhadas no futuro. A concordata geral atua como a ponta mais fina de uma cunha: seus termos são bastante vagos, fazendo com que ela possa ser aprovada facilmente pelo Congresso/Parlamento de um país [10], mas se os congressistas mais tarde criarem obstáculos diante das concordatas mais detalhadas, será dito a eles que já aceitaram as concordatas em princípio. Além disso, se a concordata geral incluía um "propósito" de concluí-la depois de certo tempo, isso pode ser usado para aplicar mais pressão, apresentando-a para a mídia como uma "promessa". [10] Uma concordata de estrutura é como uma boneca russa, que contém outra boneca em seu interior.
Segundo, e ainda mais funesto, como a concordata tem o status de Lei Internacional, ela impede que os privilégios da Igreja, incluindo os enormes subsídios pagos pelo governo, sejam algum dia colocados sob o controle democrático.
Terceiro, uma concordata estipula que "as instituições da Igreja" são governadas pelo Direito Canônico (a lei da Igreja Católica). Entretanto, como a Igreja recebe a permissão de administrar diversos serviços sociais — com o suporte do governo, é claro — as leis que governam essas instituições da Igreja também afetam aqueles que trabalham e aqueles que são atendidos por elas. Essa manobra jurídica significa que uma concordata pode criar um feudo teológico em que certos direitos humanos não se aplicam — e onde nunca poderão ser reintroduzidos sem o consentimento da Igreja.
Por meio das concordatas, os diplomatas e advogados do Vaticano estão montando um ataque contra muitas das liberdades que conquistamos desde então — direitos que considerávamos inquestionáveis. As concordatas do Vaticano representam uma ameaça crescente contra a democracia e contra os direitos humanos.
Notas
Sobre a gravura: Vestindo sua reluzente armadura prateada e brandindo sua espada, o pontífice barbudo cavalgava à frente de seu exército. Quando se tratava de expandir a influência papal, Júlio II — il papa terribile — era bem direto. Entretanto, desde o tempo do irascível "papa guerreiro", meios jurídicos e diplomáticos passaram a ser preferidos. Um pontífice moderno chefia um batalhão de advogados e diplomatas, brandindo documentos. No século XVI, o "papa guerreiro" estava meramente lutando como os outros monarcas dos tempos feudais. Hoje, entretanto, quando os alvos são as instituições democráticas, muito mais está em risco.
Júlio II, o papa guerreiro, abençoou o primeiro contingente de Guardas Suíços, os únicos soldados de infantaria que podiam resistir a um ataque da cavalaria. A alabarda deles combinava um machado na forma de meia-lua para decepar as pernas dos cavalos, um gancho para agarrar o cavaleiro e derrubá-lo no chão, e uma longa haste pontiaguda, para traspassá-lo.
1. John Fonte, citado em Scott Malcolmson, “Lawfare”, New York Times, 12 de dezembro de 2004, http://www.nytimes.com/2004/12/12/magazine/12LAWFARE.html. 2. Muriel Fraser, "A Tiara Tripla do Vaticano: Igreja, Governo e País" (artigo CW-07). 3. "The History of Ideas Vol 6: Treaty — Linguistic Issues" http://science.jrank.org/pages/11506/Treaty-Linguistic-Issues.html. 4. "The History of Ideas Vol 6: Treaty — Jurisprudence", http://science.jrank.org/pages/11510/Treaty-Jurisprudence.html. Por exemplo, o Vaticano tentou, por meio de uma "Concordata de Consciência" na Eslováquia, garantir que os pacientes pudessem ter o tratamento negado, ou até informações de saúde negadas, se isso estivesse em conflito com os escrúpulos religiosos das empresas de assistência à saúde (ou da instituição católica que os empregava). Se ratificada, colocar isso em uma concordata, tornaria a medida irreversível. Em contraste, a "cláusula de consciência" similar, que foi emitida por Ordem Executiva nos dias finais do governo Bush, poderá em breve ser revertida pelo seu sucessor. Veja "Abortion foes, supporters, clash over new rule", AP, 18 de fevereiro de 2009. http://www.usatoday.com/news/health/2009-02-18-abortion-rule_N.htm 10. Veja a Introdução da Concordata com a Eslováquia (2000), http://www.concordatwatch.eu/showkb.php?org_id=849&kb_header_id=755&order=kb_rank%20ASC&kb_id=1222 11. "US Lawmaker prods Israel on pact with Vatican", Catholic World News, 20 de junho de 2006, em http://www.cwnews.com/news/viewstory.cfm?recnum=44870
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